27.5.13

fazemos mesmo

a prova está aqui
de que somos mesmo bons 
quando pomos o que temos no que damos

fazemos o nosso melhor

"não conseguimos fazer tudo, não. mas fazemos o nosso melhor." - dizia há pouco a uma amiga, em jeito de fim de conversa, de fim de dia, de fim de ano lectivo cansado. dizia-o quase da boca para fora, para terminar de forma pacífica a nossa conversa e trazer o coração mais calmo para casa e deixar o dela também.

mas, sim, de facto, e enquanto caminhava, pensava-o, "fazemos mesmo o nosso melhor". lutamos para fazer andar os nossos projectos e sonhos e mais os projectos e sonhos dos outros. lutamos para, se no meio ainda der, tentar construir outros juntos. fazemos o que não queremos mas que tem de ser feito. fazemos andar a vida e "dar conta do recado" e, no meio de tudo, ter espaço para sermos felizes. 
dar de nós em cada coisa é fazermos o melhor. 
e há dias e meses e anos em que temos mesmo muitas coisas para fazer e que o pouco que damos faz, ainda assim, o movimento da vida. 
talvez não consigamos todos os dias chegar a todos os lados, mas, sim "fazemos o nosso melhor" e devemos dormir descansados.

11.5.13

sem abrigo


Um homem mora num jardim público durante dois anos. Tem apenas um cobertor vermelho e um copo de vinho alto. Tudo o resto são roupas, cartões e revistas que troca com frequência. Sente um imenso orgulho e gratidão por ter tido este lugar tão cobiçado por ele neste jardim da cidade e de não ter sido expulso à pedrada pela polícia, pelos outros homens ou um qualquer movimento de moradores. Mantém o seu sítio sempre arrumado e limpo. E durante o dia, quando todo o resto de moradores regressa ao jardim, ele sai pelas ruas da cidade. Procura histórias e comida. É isto que lhe basta para viver desde que escolheu o seu lugar no jardim e aprendeu a viver sobrevivendo. Adquiriu a qualidade de vida há tanto esperada. A garantia de escolher livremente o que quer que seja para a sua vida. Não tem obrigações, responsabilidades, pretensões. Basta-lhe esta casa.                                                                                                   
Mas um dia o jardim vai para obras.
Quando começaram os primeiros rumores sobre essa possibilidade, não fez parte dos movimentos que se opuseram e maldisseram as decisões tomadas. Não fez parte do Dia da Mocada em que homens e máquinas voltaram para trás sem conseguir iniciar a Muralha de Tapume que fecharia o jardim durante meses, para depois reabrir novinho em folha, todo arranjadinho. Tinha estado sempre lá, mas não, não tinha feito parte. Tinha assistido. Simplesmente. [E talvez agora percebesse que devia ter-se envolvido, mas na altura ele não sabia isso.] Aceita simplesmente e segue o seu caminho na noite em que fecham a Muralha definitivamente. Vai pela avenida fora preparado para escolher outros sítios provisórios e encara este tempo como uma grande viagem de férias em que os horizontes se abrem e uma quantidade imensa de histórias ficam à sua disponibilidade. Cria novos espaços durante o tempo em que espera pelo regresso ao jardim e pela primeira vez escreve postais para si próprio na ânsia de guardar este universo na sua casa. Quando finalmente regressa ao jardim, todo o espaço estava diferente. Todos os recantos que conhecia estavam descaracterizados e tipificados com os novos equipamentos de jardim que tornavam todos os espaços verdes iguais. 
Procurou o seu canto. O seu cheiro. Os restos de si naquele jardim e, pela primeira vez, se sentiu sem abrigo. 

8.5.13

obrigada



um amigo querido 
aliado a um espaço querido 
e a uma urgência completamente partilhada

obrigada, Castelo

7.5.13

magia

vai fiando o seu casulo. devagar. com paciência. gordo, grande e cheio de paciência. vai fiando. vai fiando. fica nisto o tempo que for preciso. e fia fia fia... a malha a ficar apertadinha. redondinha. e ele a ficar lá dentro. a desaparecer. sempre a fiar e a desaparecer. e a fiar até ao momento em que tudo pára. em que o casulo fica quieto. parado. sem sinais de vida. lá dentro há-de haver silêncio. sossego. solidão. mas transformação. 
o que se passa ali dentro? 
o movimento é invisível aos olhos. só aos olhos. porque em nós existe a expectactiva. a especulação de como tudo se move lá dentro. 
algum tempo depois é-nos brindada a borboleta. e tudo começa outra vez.
que magia a vida!