Descobri que quando estamos proibidos de determinados hábitos que temos e gostamos e nos servem, muitas vezes, de compensação no fim de um dia de trabalho, no fim de uma reunião tensa, num momento de solidão, num momento de convívio ou qualquer outro em que busquemos o prazer... Descobri que, quando estamos proibidos dessas coisas, o melhor é assumirmos para nós mesmos e para os outros que se está irritado e, sim, não havia razão para tanta cabeça perdida e tanta falsa argumentação, mas ainda não se arranjou uma outra solução que não elevar a voz e fazer movimentos frenéticos para compensar essas coisas de que estamos proibidos e provavelmente nos acalmariam e, por favor, que nos desculpem.
17.10.08
15.10.08
passear com as crianças
da minha vida fazem parte muitas crianças. aquelas com quem trabalho todos os dias, aquelas com quem já trabalhei, os primos, os "sobrinhos", aquelas que encontro por aí, a minha própria infância cheia de outras crianças. faz parte dessa vida de criança uma vontade louca de movimento. de correr. de descobrir o que existe por aí . de fazer experiências. de ir, aos poucos, saindo do colo e desatar a andar e a ver. faz parte dessa vida o "fugir", o que querer saber o que está para além, mesmo que alguém tenha dito para não ir. faz parte a curiosidade. faz parte não querer andar sempre ao pé dos pais e ir ver o que está na outra prateleira do supermercado. e faz parte da vida dos adultos que as têm consigo usar o corpo - braços, pernas, tronco, cabeça, voz - para as fazer voltar quando é necessário. para encorajar as descobertas. para as fazer sentir que, mesmo indo mais além, onde não queriam que elas fossem, o seu corpo está sempre lá para as receber. faz parte uma confiança que vai nascendo, que se vai conquistando, que ambos os mundos estão lá. vai-se mais além mas não se foge. deixa-se ir, mas não se desliga. uma distância certa entre os corpos.
como é que um braço ou uma voz não chegam para passear com uma criança?
numa livraria de um centro comercial, um fina senhora passeava hoje a sua filha como quem passeia o seu cão. o meu vizinho do segundo andar tem uma trela fisionomicamente igual à que a menina trazia à volta do tronco. os meus olhos não conseguiam largar aquela imagem. uma trela... não sei se é este o termo usado para aquele objecto que ligava a senhora à menina, mas é o termo que consigo usar por ter um vizinho que usa um objecto igual para o seu cão. quando a menina se voltou de costas, apareceu a marca que produziu o objecto. pré-natal. a famosa marca de produtos para a infância.
a minha cabeça veio embora com essa imagem gravada. uma imensidão de sentimentos revoltos. a certeza de que o corpo tem de chegar para esta educação de passear com os filhos. com os filhos. com as crianças. não se passeiam as crianças. passeia-se com elas. dá-se-lhes as mãos. dá-se-lhes o colo. dá-se o corpo. dá-se-lhes a oportunidade de sentir que é bom tocar nos outros e senti-los por perto. dá-se-lhes a certeza que não importa onde estejam, é seguro, porque também lá estamos - com os nossos braços para as salvar de perigos, com a nossa voz para as chamar se forem longe demais.
não resisti a procurar pré-natal no google. um site muito bem organizado com imensos artigos sobre a infância que, com certeza, hão-de ajudar muitas mães em apuros. não encontrei as trelas, mas encontrei a filosofia. deu-me voltas ao estômago pensar que uma cambada de gente anda a ter reuniões para decidir que o melhor para solucionar os problemas das mães que não conseguem passear com os seus filhos é criar um objecto que as faça passeá-los como suas donas.
a pré-natal esteve em baixa.
aquela senhora esteve baixíssima.
e eu agradeci muito ter nascido na província e terem-me deixado brincar na rua, ir sozinha da escola para a hora de almoço. terem passeado comigo.
os tempos talvez estejam diferentes, mas havemos de lutar para podermos continuar a passear com as crianças.
8.10.08
hora
há uma hora do dia caótica para conduzir em lisboa. hora em que dá vontade de atropelar tudo o que aparece à frente e ir directamente aos senhores responsáveis e passar-lhes o carro para as mãos e dizer-lhes: "ora experimente lá ir para casa sem ficar com os nervos em franja!"
à hora do grande regresso a casa, a partir das seis e até para além das sete e meia, hora de lusco-fusco e anoitecer, os candeeiros da rua estão ainda apagados na maior parte das ruas do trajecto que faço ao fim do dia.
é uma aventura regressar a casa.
as ruas mais escuras ficam cheias de sombras estranhas que não se sabe se é uma bicicleta que aí vem, um peão que passeia o cão ou uma betoneira mal estacionada. os olhos deixam-se ofuscar com os carros da frente e, na falta de outra luz que os faça recuperar, passam os metros seguintes numa verdadeira obra de perspicácia a tentar voltar a ver no escuro, evitando feridos e amolgadelas e tentando distinguir se, de facto, é uma bcicleta, um cão ou uma betoneira. o corpo começa a ficar enrigecido pelo esforço acrescido da cabeça e dos olhos e pelo medo de não estar a ver tudo nem a medir bem os espaços. os carros mal estacionados que, à luz do dia são aborrecidos, tornam-se insuportáveis. os quatro piscas são um desespero de luz. o corpo, enrigecido como está, demora mais a fazer manobras. procurar estacionamento, se estiver difícil, torna-se desesperante. a boca começa a ganhar vontade de dizer palavrões...
o que vale é que, nesta altura, chego a casa.
uf!
é uma hora pequena, mas que se torna imensamente longa.
vou informar os responsáveis que, apesar dos relógios universais não o saberem, já saímos do verão e os dias estão mais pequenos e os candeeiros da rua deviam acender mais cedo. evita-se assim as más disposições de fim de dia.
(que coisa! será que eles não andam de carro a esta hora?)
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